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Sidrolândia

Com regularização travada e sem acesso a crédito, arrendamento vira opção de renda para assentados

Arrendatários pagam R$ 12 mil por ano aos pequenos produtores, que continuam morando nos lotes.

Flávio Paes/Região News

02 de Dezembro de 2018 - 20:02

Boa parte dos 30 mil hectares de incremento da área plantada em Sidrolândia (que chegou a 205 mil hectares) nas últimas quatro safras, corresponde aos lotes da reforma agrária que os assentados estão arrendando para produtores de soja. Só no Assentamento Vacaria, às margens da MS-162, 20 dos 48 lotes, o gado leiteiro perdeu espaço para a oleaginosa cultivadas por fazendeiros arrendatários.

Eles pagam R$ 12 mil por ano aos pequenos produtores, que continuam morando nos lotes, mas saem durante o dia para trabalhar e complementar a renda. Há lotes arrendados no Geraldo Garcia, no Capão Bonito e em vários núcleos do Eldorado, onde, como os lotes são menores (10 hectares), a parceria só é viável, quando fechada com os parceleiros vizinhos. No município, aproximadamente 75 mil hectares foram entregues a 4.500 famílias pelo programa da reforma agrária ao longo dos últimos 25 anos.

Uma das exceções no Vacaria é o assentado Luiz Varela, que em sociedade com o irmão resolveu plantar 20 hectares de soja, com recursos próprios, porque prefere não se endividar com empréstimo bancário. Para conseguir comprar o trator que utiliza no preparo da terra, após conseguir economizar parte do salário que recebia como motorista do transporte escolar.

Com o bom resultado do ano passado, quando obteve em torno de 60 sacas por hectare, conseguiu investir R$ 12 mil na compra de sementes e adubos, além de ter uma reserva para pagar pelo aluguel da colhedeira. O excesso de chuva atrapalhou e ele teve de replantar a lavoura, o que aumentou o custo, mas sua aposta é pelo menos repetir a produtividade do ano passado. Se colher 1.200 sacas, consegue recuperar o investimento (em torno de 285 sacas) e garantir uma rentabilidade que lhe permita comprar em 2019 uma colheitadeira usada.

Há também casos como de um produtor que hoje tem 300 hectares plantados no Assentamento Geraldo Garcia, onde comprou 10 lotes e colocou em nome de familiares para escapar do risco de retomada da parcela, na eventualidade do Incra, hoje sem orçamento até para o combustível dos seus veículos, um dia retomar a fiscalização.

Neste mesmo assentamento, a dona de um lote (que terá seu nome preservado porque teme retaliação por parte do Incra), arrendou 20 hectares e receberá 10 sacas por hectare, o que lhe deve render R$ 14 mil (tomando como base o preço da soja a R$ 70,00) só nesta safra de verão. Trabalha na cidade como babá e diariamente volta para o assentamento onde continua morando e seus filhos estudam.

Na avaliação do produtor Paulo Stefanello, embora formalmente o arrendamento para o plantio de soja não seja permitido pelas regras da reforma agrária, esta foi a alternativa que os assentados encontraram para ter uma renda. “Eles não têm acesso a crédito para custear uma lavoura cara como é a soja. O cultivo de hortas nem sempre é viável porque exige uma logística de escoamento e venda da produção que muitas vezes só é viável quando o pequeno produtor se junta em cooperativas”.

No ponto de vista de Stefanello, quando o Incra promover a titulação dos lotes, a tendência é que muitas áreas sejam vendidas e reagrupadas em pequenas fazendas de até 300 hectares, como ocorreu no Geraldo Garcia, exemplo já mencionado.

Segundo o vereador Edno Ribas, embora o Incra tenha instalado há quatro anos um escritório em Sidrolândia (custeado pela Prefeitura), praticamente nada se avançou em termos de regularização das áreas que não estão mais com os assentados beneficiários da reforma agrária. “Há pelo menos 200 processos parados que simplesmente não andam. São pequenos produtores que se enquadram no perfil da reforma agrária que mesmo com toda a dificuldade, estão produzindo. Poderiam fazer muito mais, se tivessem acesso aos créditos do Pronaf”.

Com regularização travada e sem acesso a crédito, arrendamento vira opção de renda para assentados

O Incra não tem dinheiro nem para combustíveis das suas viaturas, muito menos para pagar a diária para os funcionários suas despesas de deslocamento nos assentamentos.