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Esporte

Sub-20 da Venezuela dá um chute na crise para buscar maior feito do país no futebol

Com trabalho integrado e investimento forte na base, Vinotinto se reinventa e, além de buscar título inédito, pavimenta caminho rumo à Copa. Ex-goleiro, técnico dispensa apoio de Maduro

Globo Esporte

10 de Junho de 2017 - 09:00

Patinho feio do futebol sul-americano, a Venezuela está muito perto de conquistar seu maior feito em um esporte que não tem muita lá tradição. Em meio à severa crise que assola o país vizinho do Brasil, a versão sub-20 da Vinotinto fez história ao avançar à decisão do Mundial da categoria (que será disputada neste domingo, contra a Inglaterra) e tem no grupo finalista na Coreia do Sul a esperança de preparar terreno para buscar a vaga inédita na Copa do Mundo. Consequência de um trabalho integrado, que começou a ser pavimentado há dois anos com a chegada de Rafael Dudamel para comandar a equipe principal e a sub-20.

- Durante esses dois anos, a sub20 trabalhou sob as ordens de Dudamel em módulos, com treinamentos constantes de jogadores que atuaram no futebol local. Os que jogam no exterior se juntavam depois. A Federação de Futebol da Venezuela, sempre criticada, deu apoio financeiro ao grupo sub-20 grupo e ao Dudamel para treinar com frequência. Eles usaram o Centro de Alto Rendimento em Margarita, a casa da Vinotinto, para a maioria destas atividades. Na última etapa, um pouco antes do Mundial e já com os 21 convocados, a seleção viajou para a Itália, treinou em Turim e encarou rivais como o time sub-20 de Juventus e Sampdoria, entre outros. O departamento técnico contou com respaldo apoio financeiro – explica o jornalista Liber Nan Piñera, repórter do “Diario Panorama”.

Confira a tabela do Mundial Sub-20

Ex-goleiro da seleção, Rafael Dudamel acumula função dupla e é um dos grandes responsáveis pelo bom momento (Foto: EFE)

Ex-goleiro da seleção, Rafael Dudamel acumula função dupla e é um dos grandes responsáveis pelo bom momento (Foto: EFE)

Se o título mundial sub-20 pode coroar um trabalho iniciado há dois anos, os frutos começaram a ser colhidos no início de 2017, no Equador. No Sul-Americano, a Venezuela foi um dos destaques do torneio, brigou até a última rodada pelo título inédito e se classificou para o Mundial pela segunda vez na história, tirando a vaga que seria do Brasil. Rogério Micale, treinador da Seleção à época, já via a equipe de Rafael Dudamel como uma das forças promissoras do futebol sul-americano.

- Eu vi a Venezuela no Sul-Americano como a grande força do torneio e comentei isso no período. Seria o maior destaque da competição, ao contrário do que se falava no Brasil. Eles estão com um trabalho consistente há algum tempo, de resgaste, de jogadores da base. O processo formativo deles está muito interessante. Por mais que tenha uma crise violenta, eles têm um projeto de captação e metodologia de treino muito interessante – disse Micale, em entrevista por telefone.

Venezuela e Inglaterra fazem a final neste domingo às 7h em Suwon

As estrelas da Venezuela na Coreia do Sul

Wuilker Farinez (Caracas-VEN)

Williams Velasquez (Estudiantes de Caracas-VEN)

Yangel Herrera (New York City, emprestado pelo Manchester City)

Adalberto Penaranda (Malaga, emprestado pelo Watford)

Yeferson Soteldo (Huachipato-CHI)

Ao longo desses dois anos, Micale acompanhou de perto a evolução da base venezuelana. Em 2015, inclusive, participou de um congresso no Chile no qual diretores da federação local apresentaram o projeto que vem rendendo frutos agora.

- Eles começaram a oferecer alternativas para se se oferecer aos mais pobres uma alternativa de praticar esporte. Eles começaram a disseminar vários núcleos de futebol em áreas carentes. É como se fossemos a uma favela no Rio, com um campinho de terra, e chegasse lá um professor lá para dar condição de treinamento. E isso foi implantado em vários lugares na Venezuela. Era um trabalho semanal, acho que três vezes por semana. E despertava na população mais jovem o desejo de jogar futebol. Desse núcleo, alguns jogadores eram selecionados, iam para os clubes e em seguida para a seleção, que passou a ter mais condição técnica e física – completou Micale.

Povo nas ruas e resposta a Maduro

No Equador, a Venezuela passou invicta da primeira fase e no hexagonal final goleou Equador e Uruguai, ambos classificados para o Mundial, a ponto de chegar à última rodada com chances de título. Terminou na terceira colocação. Na Coreia do Sul, foi ao lado da França a única equipe com 100% de aproveitamento. Depois, passou por Japão, EUA e Uruguai até chegar à inédita final. Campanha que tem tudo para levar o povo venezuelano às ruas – e não estamos falando de questões políticas.

- O povo venezuelano está muito focado em seus protestos de rua e o horário dos jogos aqui, às 2h e às 6h, não ajudam. Mas todo o país está muito orgulhoso e surpreso com o que foi alcançado diante de potências do futebol. O futebol é, entre as novas gerações, o esporte favorito. Agora, tenho certeza que muitos vão acordar cedo no domingo para acompanhar a final contra a Inglaterra. Aconteça o que acontecer, os torcedores seguirão em massa para receber a Vinotinto no retorno a Caracas na terça-feira.

Com gol de Vizeu, Brasil foi uma das duas seleções que venceu a Venezuela no Sul-Americano Sub-20 (Foto: Dolores Ochoa/AP)

Com gol de Vizeu, Brasil foi uma das duas seleções que venceu a Venezuela no Sul-Americano Sub-20 (Foto: Dolores Ochoa/AP)

E o momento é tão positivo que até o presidente Nicolás Maduro tentou tirar uma casquinha da campanha na Coreia do Sul, com direito a discurso patriótico em vídeo divulgado nas redes sociais. Rafael Dudamel não tardou a responder o sucessor de Hugo Chávez com duras críticas à situação atual no país:

- Por favor, pare. Hoje foi um menino de 17 anos que nos deu alegria. Ontem morreu um outro menino de 17 anos. O presidente, parem as armas. Aqueles garotos que saem às ruas sonham com uma Venezuela melhor e querem aproveitar a vida em território venezuelano – criticou o treinador, que defendeu a meta da Venezuela como goleiro em 57 partidas.