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Artigo: O direito de errar

O público habituou-se a esse percalço no dia a dia dos jornalistas

Carlos Alberto Silva

27 de Junho de 2016 - 13:19

A transparência da informação, bem como do processo que a origina e a propaga, é um dos preceitos básicos de todo veículo de imprensa que se pauta pelo respeito à ética e, especialmente, ao seu público. Não há outro caminho para conquistar um patamar de credibilidade capaz de situá-lo no horizonte jornalístico para onde a opinião pública dirige seu campo de visão.

Pois bem, é ingênuo acreditar que, nesse complexo universo onde se constrói a informação, o processo seja impecavelmente pontuado com exclusividade por acertos e decisões corretas dos responsáveis por sua elaboração. Os obstáculos, os passos em falso eventualmente os tropeços tornam-se naturais e, pode-se dizer aceitáveis nesta época em que a velocidade da notícia é ditada pela própria exigência de um público cada vez mais ávido pela instantaneidade acessada por meio das mídias digitais.

Portais de notícias, emissoras de rádio e televisão e também os jornais impressos permitem-se corrigir erros cometidos sob a tensão ou, até mesmo, sob o ímpeto de um cotidiano de constantes turbulências ocasionadas pela apuração das diferentes versões que geralmente constituem um determinado objeto de informação. É bastante comum o leitor deparar-se com o famoso “erramos” na página de opinião, ou o telespectador ou ouvinte ser alertado pelo apresentador com o indefectível “ao contrário do que dissemos há pouco....

O público habituou-se a esse percalço no dia a dia dos jornalistas. E de certo modo passou a encará-lo como circunstância compreensível de um trabalho sujeito a dificuldades como qualquer outro. Porque, afinal de contas, todos nós cometemos erros. Poucos ou muitos, simples ou graves, os erros estão aí para nos lembrar dessa característica tão latente em nossa condição humana: somos falhos.

No entanto, ao contrário do público consumidor de informação, o jornalismo parece não ter ainda se habituado compreensão que também se exige dele próprio em sua relação diária com agentes participativos, e efetivos, na produção da notícia. Talvez a principal vítima dessa arrogância sem sentido esteja personificada na figura do assessor de imprensa, primo em primeiro grau daquele que desenvolve sua atividade na redação, mas que geralmente é tratado como um daqueles parentes indesejados como quais é necessário manter ao menos uma relação de cínica cortesia.

Ao assessor de imprensa, ainda não é permitido errar. Uma resposta solicitada pelo veículo de comunicação não pode ser corrigida. Enviar uma segunda versão assemelha-se a um crime imperdoável, com direito a execração pública. Está se tornando comum, por exemplo, apresentadores de telejornais questionarem no ar correções enviadas pelos assessores de imprensa. Mesmo que a atualização colabore para que a informação chegue ao público mais precisa ou mais rica em detalhes ou mais próxima daquilo que chamamos de verdade.

O fato é que, além de humano, errar também é profissional. Enfrentar o erro com transparência e honestidade é um saudável exercício de humildade. E a humildade, essa postura de cujas fronteiras o jornalismo costuma esquivar-se constantemente, é um dos princípios fundamentais para mantermos em dia a consciência de que somos infinitamente menos importantes do que aquilo que produzimos: a informação. O pior erro de jornalistas e assessores de imprensa é permitir o erro na informação levada ao público por receio de admitir seu legítimo direito de errar.

* Carlos Alberto Silva, 57, é jornalista e assessor de imprensa.