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Um jornal a serviço do MS. Desde 2007 | Quinta, 28 de Março de 2024

Saúde

'Quero desparecer', como reconhecer sinais de suicídio e o que fazer para ajudar

O psiquiatra Filipe Batista reflete sobre a questão em nova coluna.

VOGUE

12 de Setembro de 2019 - 13:25

Cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) e é a segunda maior causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos, atrás apenas de acidentes de trânsito. Hoje, 32 brasileiros se suicidam diariamente. No mundo, ocorre uma morte a cada 40 segundos. Além disso, o total de tentativas pode superar o de suicídios em pelo menos dez vezes. Por isso, embora muito delicado, o assunto que ainda é permeado por muitos tabus e mitos, não deve ser evitado.

Um bom ponto de partida para tratar a questão é o diálogo. É equivocada a ideia de que conversar sobre suicídio pode incentivar alguém a tirar sua própria vida. Na verdade, ter a liberdade de abordar o assunto e expressar os sentimentos - através de uma escuta atenta, empática e sem julgamentos - pode ajudar a restaurar a esperança de quem tem pensamentos suicidas. Esse primeiro canal de apoio, que frequentemente é encontrado na de família e amigos, pode fornecer um amparo inicial, além de permitir a busca subsequente por ajuda profissional.

Mas como conversar e oferecer ajuda a um amigo ou familiar sem saber identificar os sinais de risco e ter familiaridade com a abordagem mais adequada? O reconhecimento de alguns sinais - embora não seja sempre possível ou fácil -  pode ser muito útil. As pessoas sob risco de suicídio costumam falar sobre morte e suicídio mais do que o comum, confessam se sentir sem esperanças, culpadas, com baixa autoestima e têm visão negativa sobre a vida e o futuro.

A ideação suicida expressa jamais deve ser ignorada, além de frases como “vou deixar vocês em paz”, “queria poder dormir e nunca mais acordar”, “é inútil tentar fazer algo para mudar”, "preferia estar morto” ou “quero desaparecer”. Isolamento, diminuição do autocuidado, perda do interesse e do prazer, automutilação, piora do desempenho na escola ou no trabalho, alterações do sono e apetite, também devem ser valorizados.

Por outro lado, esses sinais de alerta não devem ser considerados isoladamente e não são garantia de detectar seguramente quando uma pessoa está sob risco. Nesse contexto, é fundamental retirar a culpa que alguns familiares e amigos que perderam alguém próximo carregam, afinal, há muitos casos em que nenhum sinal foi emitido. Além disso, percebê-lo, interpretá-lo e tomar a atitude correta pode ser muito difícil. Na verdade, por mais solitário que esse ato extremo possa parecer, ele afeta todos ao redor - filhos, pais, maridos e mulheres, amigos e colegas - e a ajuda de um profissional de saúde mental também pode ser necessária aos demais envolvidos.

O suicídio pode afetar pessoas de todas as idades e de ambos os sexos. Embora o seu índice seja maior entre homens, as mulheres apresentam maior número de tentativas. Uma tentativa prévia de suicídio é também um fator de risco importante - aqueles que já tentaram podem apresentar um risco até cinco vezes maior. Há também uma ligação bem documentada entre suicídio e alguns transtornos mentais - como depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia, transtornos de personalidade, abuso ou dependência à substâncias -  embora também possa ocorrer na ausência de qualquer transtorno mental.

Eventos traumáticos, que incluem abusos psicológicos ou físicos, ou situações de estresse, como perda de emprego, crises políticas e econômicas, discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, sofrimento no trabalho, conflitos familiares, perda de um ente querido, entre outros, podem ser também fatores de vulnerabilidade.

Uma vez reconhecida a ideação suicida, ainda que frágil e incipiente, buscar ajuda de um profissional de saúde mental é fundamental. A oportunidade de dispor de um espaço seguro de acolhimento, um canal de diálogo e abertura para expor a questão e receber o tratamento adequado, são de suma importância para mudar o rumo dessa escolha tão definitiva. Lembrar que uma boa conversa constrói pontes e pode ajudar a curar feridas, pode ser um excelente caminho para entender que a dor é inerente à condição humana, mas permanecer em sofrimento não precisa ser a única opção.

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