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Sidrolandia

CCJ da Câmara aprova projeto que torna crime ajudar mulher a abortar

No caso de estupro, projeto exige que grávida informe ocorrência à polícia. Texto também classifica como crime induzir o uso de substâncias abortivas.

G1

21 de Outubro de 2015 - 18:00

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (21) uma proposta (leia o texto) que torna crime induzir ou auxiliar uma gestante a abortar.

A matéria, um projeto de lei de 2013 de autoria do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), segue agora para votação no plenário da Casa.

 (Correção: ao ser publicada, esta reportagem informou que a comissão aprovou lei que proíbe a venda da pílula do dia seguinte, mas o projeto não especifica quais são as substâncias consideradas abortivas. A informação foi corrigida às 13h19)

Atualmente, a lei já prevê pena de prisão para dois envolvidos diretamente no aborto: a gestante e quem nela realizar as manobras abortivas. Com o projeto, passa a haver previsão de penas específicas para quem também induzir, instigar ou auxiliar a gestante a abortar.

As exceções que o projeto prevê são as hipóteses em que a legislação brasileira já permite o aborto atualmente – casos em que houver risco à vida da gestante ou se a gravidez for resultado de estupro. Em 2012, o Supremo Tribunal Federal decidiu que aborto de feto anencéfalo também não é crime.

Estupro

No caso do estupro, para que um médico possa fazer o aborto, o projeto de lei passa a exigir exame de corpo de delito e comunicação à autoridade policial. Atualmente, não há necessidade de comprovação ou comunicação à autoridade policial – basta a palavra da gestante.

Penas

Segundo o projeto, quem induzir, instigar ou ajudar a gestante ao aborto receberá pena de prisão de seis meses a dois anos.

Também incorre nas mesmas penas aquele que vender ou entregar, ainda que de forma gratuita, substância ou objeto para provocar o aborto, ressalvadas as exceções previstas na lei.

Pela proposta, se a indução ao aborto for praticada por agente de serviço público de saúde ou por quem exerce a profissão de médico, farmacêutico ou enfermeiro, a pena será de um a três anos de detenção.

No caso de gestante menor de 18 anos, as penas serão aumentadas de um terço.

Substâncias abortivas

O texto proíbe o anúncio e venda de métodos abortivos, mas não especifica quais são essas substâncias ou meios, o que gerou intensos debates entre os parlamentares.

Hoje, a venda de abortivos é ilegal, mas é enquadrada no rol dos crimes contra a saúde pública, como falsificação de medicamento ou sem registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Com o projeto, a proibição da venda de abortivos passa a ser citada de forma expressa na lei.

Polêmica

Outro ponto polêmico do projeto é o que permite que o profissional de saúde se recuse a fornecer ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo.

"Nenhum profissional de saúde ou instituição, em nenhum caso, poderá ser obrigado a aconselhar, receitar ou administrar procedimento ou medicamento que considere abortivo", diz o texto do projeto.

De acordo com o relator, deputado Evandro Gussi (PV-SP), o farmacêutico pode deixar de fornecer pílula do dia seguinte, por exemplo, se considerar que isso viola a sua consciência.

"O projeto quer tratar é da liberdade de consciência. A consciência é inviolável. Não posso obrigar uma pessoa a ser coagida em relação a suas crenças”, disse.

Pró e contra

Deputados de alguns partidos, entre os quais PT, PSOL e PCdoB, foram contrários ao texto por considerá-lo “genérico demais” e por julgarem que deixa nas mãos do profissional a decisão sobre o que é ou não abortivo. “Há uma frouxidão legislativa”, criticou o deputado Rubens Pereira Jr. (PCdo-MA).

O plenário da comissão foi tomado por manifestantes favoráveis ao projeto. Toda vez que algum parlamentar discursava contra o aborto, eles brandiam cartazes com os dizeres: “Sim à vida, Sim ao PL 5069/2013”.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) criticou a proposta argumentando que as mulheres vítimas de estupro poderão ser penalizadas porque, na interpretação dela, não terão acesso à pílula do dia seguinte.

A deputada também afirmou que mulheres pobres serão ainda mais prejudicadas, já que, para ela, a medida não vai impedir que os abortos continuem acontecendo.

“As mulheres ricas conseguem recorrer a clínicas no exterior. As pobres continuarão correndo risco de vida ao tentar um aborto clandestino”, afirmou Kokay.

Ela chegou a apresentar um requerimento para adiar a votação, mas a sugestão não foi aceita.

O deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) saiu em defesa do projeto e disse que poderia “falar com propriedade”, uma vez ser ele próprio “fruto de um aborto mal feito”.

“Posso falar com propriedade porque sou fruto de um aborto mal feito, para alegria de uns e tristeza de outros. Minha mãe tinha, inclusive, uma clínica de aborto. Só eu sei o quanto gasto com a minha mãe por causa dos traumas psicológicos que ficaram depois de tantos abortos que fez”, disse Feliciano.