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Sidrolandia

Novo assentamento fica a 100 km da cidade e não tem estrada de acesso a Sidrolândia

A propriedade de 2.500 hectares que pertencia ao advogado Plinio Rocha (que foi secretário no Governo de Wilson Barbosa Martins), custou ao INCRA R$ 16,5 milhões.

Flávio Paes/Região News

18 de Julho de 2013 - 08:53

O novo assentamento de Sidrolândia (o 24º) que será criado na Fazenda Nazaré, fica a 100 quilômetros da área urbana, às margens da BR-163, espremido entre  Anhandui (distrito de Campo Grande, a 10 quilômetros ) e Nova Alvorada do Sul(a 40 km).

 

A propriedade de 2.500 hectares que pertencia ao advogado Plinio Rocha (que foi secretário no Governo de Wilson Barbosa Martins), custou ao INCRA R$ 16,5 milhões. Faz fundos para o Assentamento Alambari e não há uma estrada de acesso  direto, é preciso sem passar pela rodovia federal.

 

Na Fazenda ainda moram três funcionários que cuidam do gado, incluindo 600 cabeças pertencente ao ex-deputado Ricardo Bacha, dono da Fazenda Buriti, ocupada por índios, onde no último dia 30 de maio morreu o terena Oziel Gabriel durante a tentativa de reintegração de posse  promovida pela Polícia Federal.

 

O acesso à sede principal está fechado depois que um grupo de acampados teria entrado lá e depredado a casa.  O rebanho começou a ser removido e a expectativa é de que em 30 dias, o INCRA efetivamente toma posse. Dona Edna Paiva, mulher do capataz, trabalha há 10 anos na Nazaré. Sua expectativa, junto com a de outros dois funcionários, é ser contemplada com um dos lotes.

 

O superintendente do INCRA, Celso Cestari, garante que ninguém tem garantia antecipada de ganhar um lote, antes de passar por um processo de seleção rigoroso. Será excluído quem tiver passagem pela polícia ou condenação da Justiça.

 

Mesmo assim, as 50 famílias que há quatro anos estão acampadas em frente da fazenda, às margens da BR-163, mostram confiança que estão entre as 150 famílias (ou 157 ainda não se sabe ao certo) contempladas com lotes de 16 hectares, encerrando um ciclo de oito anos de vida cigana, migrando de acampamento em acampamento, sempre orientadas pelos movimentos sociais a que estão vinculados (MST, CUT e Fegrari) a se fixar onde há propriedades passíveis de desapropriação ou compra para a reforma agrária.

 

Entre os acampados que o Região News encontrou na terça-feira à tarde, nenhum é de Sidrolândia, nem tem título de eleitor aqui. A maioria dos homens trabalha nas usinas de álcool de Nova Alvorada do Sul e Rio Brilhante, ou fazendas da região, enquanto as mulheres ficam de guardiães dos barracos. Há também muitos aposentados.

 

As crianças estudam na escola municipal Izaura Nogueira, em Anhanduí, onde também recorrem ao posto de saúde em caso de necessidade. Capão Seco (onde a Secretaria de Saúde estaciona o consultório itinerante montado num ônibus) e o Assentamento Jibóia (onde fica uma escola municipal), fica muito longe que percorrer 10 quilômetros, atravessar o Rio Anhandui e chegarão distrito de Campo Grande.

 

Dona Rosemeri de Amorim, 43 anos, está há oito anos morando em diferentes acampamentos na região. As filhas que passaram a adolescência acampadas, ficaram adultas, casaram fora embora. Hoje, ela cuida dois netos, um de dois e outro de quatro anos, enquanto a mães deles mora em Fátima do Sul onde trabalha.

 

“Aqueles são bem cuidados. Brincam o dia inteiro e já se acostumaram a dormir no escuro. Para evitar o risco de incendiar o barraco, apago a vela”. Seu marido, Faustino dos Santos, trabalha na usina Santa Luzia, em Nova Alvorada do Sul, para uma empresa terceirizada, onde ganha R$ 1 mil e só vem aos finais de semana.

 

Esta rotina não deve mudar quando tiver recebido o lote. “Ele tem que continuar saindo para trabalhar para a gente sobreviver”, explica. Como o único capital do casal para transformar o lote numa propriedade produtiva, inicialmente o dinheiro da sobrevivência virá mesmo do salário e do bolsa família que recebe, fundamental para ajudar a cuidar dos netos.

 

Dona Rosemeri conta com o crédito de fomento do Incra  (em torno de R$ 3,2 mil e R$  2,2 mil especificamente  destinado às  mulheres) para se estabelecer no lote  (compra de ferramentas,  material de uso doméstico)  e  os recursos  para construção da casa (um financiamento 90% subsidiado de R$ 25 mil) embora  tanto ela, quanto o marido, tenham  restrições cadastrais. “Acho que isto não vai ser problema”. Imagina que com o dinheiro do Pronaf (R$ 21 mil), colocar em pé seu projeto de uma lavoura de subsistência, com horta, ter algumas vacas para a produção de leite.

 

Novo assentamento fica a 100 km da cidade e não tem estrada de acesso a Sidrolândia


Estes sonhos são compartilhadas por uma das vizinhas de barracos, que deixou casa e os filhos, em Campo Grande, para se aventurar em busca de um lote da reforma agrária. Seu neto de quatro anos faz companhia para ela, enquanto o marido, de 63 anos, ganha vida trabalhando numa fazenda em Ribas do Rio Pardo, a quase 200 quilômetros de distância.  Cria galinha e mantém uma pequena horta no acampamento, além de produzir e vender tapetes de crochê.

 

O primeiro a levantar acampamento no local foi Natalino José da Silva, 62 anos. O aposentado conta que vivia em outro acampamento em São Gabriel do Oeste, mas resolveu se fixar ali num trecho da BR-163 que é uma encruzilhada de três cidades: à margem esquerda (de quem vai em direção a Dourados) é Nova Alvorada do Sul. À esquerda, Sidrolândia, recuando 12 quilômetros, está em território de Campo Grande.

 

“Falaram para gente que ia ser mais rápido e acreditamos. Levantei meu barraco no dia 30 de janeiro de 2009 e nunca mais saí”, conta o aposentado.Em poucos meses, mais de 150 famílias montaram acampamento nas redondezas. Muitas desistiram, outras foram embora e voltaram, mas Maria Ilma, de 65 anos, continuou na região com esperança de que as terras fossem demarcadas.

 

A aposentada deixou os 4 filhos em Dourados e resolveu se mudar com o marido para um barraco de lona. As vigas de madeira e tábuas foram doadas pelas lideranças dos movimentos e a construção dos barracos foi feita em mutirão. “Quando chegamos aqui o prazo era que em 4 ou 5 meses teríamos o lote. Mas o dono acabou indo embora e só ficou um capataz, o processo demorou, mas nunca entramos na fazenda. Eu sabia que a nossa hora ia chegar e eu nunca perdi a esperança”, conta Maria Ilma.

 

A existência dos barracos às margens da BR-163 muitas vezes não é notada por motoristas que passam em alta velocidade pela rodovia. As lonas pretas, tábuas, frio, chuva galinhas e cachorros fazem parte da rotina dos acampados.