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Policial

Sob pressão da ONU, Polícia Civil investiga assassinato de líder indígena

O corpo de Marinalva foi encontrado nu, às margens da BR-163, na manhã de sábado, dia 1º de novembro. Ela foi morta com 35 golpes de faca

Campo Grande News

07 de Novembro de 2014 - 09:10

A Polícia Civil já ouviu várias pessoas, tem um suspeito de ser o autor do crime, mas ainda não considera esclarecido o assassinato da líder indígena Marinalva Manoel, 27 anos, ocorrido na semana passada em Dourados, e que provocou pedido de investigação de representante da ONU (Organização das Nações Unidas). O corpo de Marinalva foi encontrado nu, às margens da BR-163, na manhã de sábado, dia 1º de novembro. Ela foi morta com 35 golpes de faca.

O delegado Edmar Batistela, da 2ª Delegacia de Polícia de Dourados, disse hoje ao Campo Grande News que os depoimentos ouvidos até agora, de familiares de Marinalva, de lideranças do acampamento indígena “Nhu Porã”, onde ela morava, e de um funcionário da Funai (Fundação Nacional do Índio), indicam que o crime foi passional. “Não há indícios de que se trata de um crime ligado ao conflito de terra”, afirmou.

O acampamento onde Marinalva morava fica próximo ao perímetro urbano de Dourados, entre os bairros Guaicurus e Parque das Nações, e está localizado numa área reivindicada pelos índios, cujos estudos antropológicos iniciais apontaram como terra indígena. Entretanto, o local pertence a uma empresa de paisagismo e parte está sendo loteada.

Recentemente o MPF (Ministério Público Federal) alertou às pessoas que estão comprando terrenos no loteamento “João Carneiro Alves” sobre a eventual demarcação. “Toda a área está passando por levantamento antropológico pelo Grupo Técnico Dourados-Amambaipeguá, que já identificou elementos comprobatórios de ocupação tradicional por indígenas guarani-kaiowá”, afirmou o MPF.

Edmar Batistela informou que o companheiro de Marinalva é suspeito do crime, entretanto a polícia segue também outras linhas de investigação. “Essa pessoa é sim suspeita, mas ainda não foi localizada”, afirmou o delegado.

Duas semanas antes de ser assassinada, Marinalva participou de protesto de índios de Mato Grosso do Sul em Brasília, contra decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que barra a demarcação de uma área em Caarapó e poderia gerar uma reação em cadeia em todo o país. Por três votos a um, a 2ª Turma do Supremo decidiu que os índios não teriam mais direito pela terra porque não estavam no local antes de 1988, quando a Constituição foi promulgada.

Pressão da ONU – Nesta quinta-feira, a representante da ONU Mulheres Brasil, Nadine Gasman, pediu “rigor” e “celeridade” na investigação sobre o assassinato de Marinalva Manoel. Em nota oficial, Nadine disse que a kaiowá era uma “mulher jovem obstinada que ousou defender os direitos dos povos indígenas, inclusive o de garantia à terra, e de sua ancestralidade, como ocorreu em 15 de outubro passado, quando esteve em Brasília como parte de comitiva indígena reunida com representantes do Judiciário”.

“O assassinato de Marinalva Manoel nos acomete de extremo pesar pela violência e pela truculência com que sua vida foi ceifada. Ela era uma das defensoras da demarcação da terra indígena Ñu Verá e integrante do Grande Conselho Guarani-Kaiowáda Aty Guassu. Frente ao perfil e às ameaças recebidas pela vítima, são evidentes os elementos de feminicídio, assassinato de mulheres por razão de gênero”, afirma Nadine Gasman.

A representante da ONU encerra a nota solicitamos ao poder público rigor e celeridade na investigação e justiça para o assassinato. “A familiares e aos povos indígenas do Brasil, manifestamos solidariedade”.

Carta ao MPF – Nesta semana, o Conselho da Aty Guasu enviou carta a Deborah Duprat, coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, e ao procurador da República em Dourados Marco Antonio Delfino de Almeida, pedindo “investigação justa” sobre o crime. “Todos nós povo Guarani e Kaiowá que estamos sofrendo ameaças de morte, ameaças de despejo, ameaças de invalidação dos laudos antropológicos de nossas terras indígenas tradicionais, decidimos que não vamos aceitar essa impunidade pacificamente, chega de morte de Kaiowá”, afirma a carta.