Policial
Em região de conflito, frei que visita aldeias recebe recado ameaçador
De acordo com o boletim de ocorrência, o homem abordou a mulher, que trabalha voluntariamente no Bazar da Comunidade, perguntando do frei
Midiamax
30 de Outubro de 2015 - 16:50
Uma voluntária de uma paróquia da Igreja Católica em Iguatemi, de 50 anos, procurou a Polícia Civil da cidade na tarde desta sexta-feira (30) para registrar boletim de ocorrência em que registra a ameaça velada feita por um homem por volta das 10h ao frei Álido Rosa, de 78 anos. O rapaz a abordou na saída do mercado e afirmou que o frei deve ter ter cuidado. Álido é conhecido por seu trabalho com indígenas, o que, segundo o homem, irrita os pecuaristas, que tem ódio dele. A cidade fica no Cone-Sul, uma das regiões que é foco dos conflitos agrários entre fazendeiros e índios em Mato Grosso do Sul.
De acordo com o boletim de ocorrência, o homem abordou a mulher, que trabalha voluntariamente no Bazar da Comunidade, perguntando do frei. Ela respondeu que ele estava na cidade e não em Santa Catarina, estado em que nasceu e visita constantemente.
O autor pediu para ela repassar o seguinte recado: pra ele ter cuidado, se preservar, pois o momento não é bom pra vocês, embora eu conheço que o trabalho de vocês é do bem, entre os ruralistas há inimigos e interpretam que o Frei incentiva as invasões dos índios, e que tem alguns pecuaristas que têm ódio do frei, então agora é um momento de cautela e de cuidado.
A voluntária informou que ligou para um serviço de proteção aos direitos humanos do Governo Federal e a orientação que recebeu foi registrar o boletim de ocorrência.
De acordo com as informações da delegacia não houve ameaça como caracteriza a lei. O boletim de ocorrência foi aberto como preservação de direito. "Não haverá investigação do fato, mas é uma medida de preservação para a mulher, caso ocorra novamente já tem o boletim", explica.
O frei Álido Rosa tem 78 anos e há décadas, segundo a irmã Joana, que atua na Paróquia São Francisco Sales de Campo Grande, convive e faz visitas às aldeias indígenas da etnia guarani-kaiowa levando mantimentos. "Ele é conhecido como 'painho' pelos indígenas de lá, eles gostam muito dele, tem uma relação muito boa", destaca.
Iguatemi, que fica a cerca de 460 quilômetros de Campo Grande, é um dos municípios que sofre com o conflito agrário. Na década de 70, a União retirou os índios das áreas tradicionais e titulou as terras aos proprietários rurais, época que foi criada a Aldeia Porto Lindo, situada em Japorã.
Anos depois, os indígenas começaram a reivindicar a terra tradicional, iniciando, em 1982, o procedimento demarcatório da Terra Indígena Yvy Katu. Em 2005, uma área de 9484 hectares que engloba parte de 14 fazendas foi declarada como tradicional pelo Ministério da Justiça, mas ações judiciais barraram a demarcação definitiva do território.
Em dezembro de 2009 houve confronto entre indígenas e fazendeiros, durante uma tentativa de ocupação na fazenda Cachoeira, situada no limite entre Tacuru e Iguatemi. Em dezembro de 2011 outro confronto foi registrado, quando indígenas, representantes do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Força Nacional e MPF (Ministério Público Federal) estiveram no local.
Ainda na região do Conesul foi registrado, na mesma época, tiroteio. Líder indígena viu dois homens de moto invadiram o Acampamento Pyelito Kue, próximo ao município de Iguatemi, atirando contra os índios. No mesmo local, no dia 18 de novembro, foi registrada a morte do cacique Nísio Gomes.