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SIDROLÂNDIA- MS

Em 10° lugar no ranking de violência doméstica, falta estrutura à rede de acolhimento em Sidrolândia

Há carência de pessoal e viatura; os mesmos problemas das demais forças de segurança instaladas na cidade.

Redação/Região News

16 de Fevereiro de 2025 - 20:23

Em 10° lugar no ranking de violência doméstica, falta estrutura à rede de acolhimento em Sidrolândia
Sala Lilás de Sidrolândia. Foto: Cláudia Gaigher/TV Morena

Com o município em 10⁰ lugar no ranking estadual da violência doméstica, a rede de proteção às vítimas em Sidrolândia está longe de contar com uma estrutura adequada de responsabilidade do Governo do Estado. Há carência de pessoal e viatura; os mesmos problemas das demais forças de segurança instaladas na cidade.

Desde o início do ano a Sala Lilás, o espaço de acolhimento das vítimas que procuram a Delegacia de Polícia, está sem a psicóloga porque ainda não foi renovada a cedência pela Prefeitura da profissional, servidora municipal, responsável pelo trabalho. As duas policiais militares que no contraturno do serviço administrativo atuam no premiado Promulse - Programa Mulher Segura - não dispõem de uma viatura própria para se deslocar até a casa das vítimas sob medida protetiva.

O trabalho delas é avaliar se as mulheres com medida protetiva precisam de algum apoio e certificar que o agressor se mantém longe, conforme a determinação judicial. Para que o trabalho seja feito, elas dependem da disponibilidade das poucas viaturas colocadas à disposição do efetivo da  8ª Companhia Independente da Polícia Militar para todas as suas tarefas diárias, incluindo barreiras, policiamento ostensivo ou escolta de presos até sistema penitenciário em Campo Grande.

Conforme o painel estatístico do SIGO (Sistema Integrado de Segurança), foram registrados em Sidrolândia nos primeiros 45 dias deste ano, 39 casos de violência doméstica, o que corresponde a 13,87% das 281 ocorrências do ano passado na Delegacia da Polícia Civil de Sidrolândia. Nos últimos quatro anos, foram 1.237 casos, além de 6 tentativas de feminicídio; três feminicídios e 159 estupros. Nas duas primeiras semanas, já foram computados 5 estupros.

Se a mulher estiver em risco de feminicídio, mesmo com medida protetiva, ela será encaminhada para a Casa da Mulher Brasileira em Campo Grande, onde receberá acolhimento institucional. Esse encaminhamento ocorre apenas em casos extremos, quando a equipe identifica que ela realmente corre risco de ser morte pelo agressor.

Em 10° lugar no ranking de violência doméstica, falta estrutura à rede de acolhimento em Sidrolândia
Psicóloga Aletânia Ramires. Foto: Divulgação

A psicóloga Aletânia Ramires, que atuou na montagem da rede de proteção às vítimas, explica que se houver violência física, a mulher pode procurar uma unidade de saúde, onde será atendida e encaminhada ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) ou para a delegacia, caso queira registrar um boletim de ocorrência.

Nesse caso, ela será acompanhada pela equipe e receberá suporte e acompanhamento. Se procurar diretamente a delegacia, ela pode registrar o boletim de ocorrência, passar pelo atendimento na Sala Lilás e, em seguida, ser encaminhada para acompanhamento no CREAS. Caso solicite uma medida protetiva, o CREAS também será responsável por acompanhar essa medida. A dificuldade é que as vítimas muitas vezes se recusam a receber a equipe do CREAS. Elas não são obrigadas a cumprir as recomendações da equipe de apoio. Muitas vezes desistem porque se reconciliaram com o agressor.

Em meio ao clamor público despertado pelo feminicídio em que a jornalista Vanessa Prado, morta no último dia 12 pelo ex-noivo, Caio Nascimento, surgiram questionamentos sobre a necessidade de mudar o aparato legal de proteção à mulher agredida. Também está sendo denunciada uma suposta negligência da equipe que atendeu a jornalista na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher em Campo Grande. Para a psicóloga Aletânia, que é especialista em Políticas Públicas de Gênero e Raça pela UFMS, o questionamento sobre a eficácia do arcabouço legal serve  para desmascarar um problema estrutural do sistema de Justiça no Brasil. "Infelizmente a Justiça só age na maioria dos casos quando a violência chega ao extremo. O sistema jurídico brasileiro ainda minimiza a violência doméstica, tratando agressões anteriores como casos isolados e não como uma escalada para o feminicídio. Neste caso da jornalista, o agressor só  foi preso após matar. Medidas protetivas não têm fiscalização rigorosa; muitos juízes não veem a violência doméstica como crime grave até que a vítima seja morta o que de certa forma. Isto incentiva a agressores a continuarem por causa da percepção de impunidade.

A Lei Maria da Penha prevê medidas como prisão preventiva para quem descumpre medidas protetivas, mas muitas vezes isso não é aplicado na prática. No caso do assassino da jornalista, ele tinha 11 registros de boletim de ocorrência. Faltou vontade política e judicial para mantê-lo afastado das vítimas.

A Justiça e a sociedade ainda tendem a dar “benefícios da dúvida” para homens violentos: “Ele pode mudar”; “Foi só uma briga de casal”, “Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”; “mulher gosta de apanhar”; “Ele está arrependido”, essa mentalidade faz com que criminosos reincidentes sigam soltos, mesmo quando há um histórico de violência claro.

Nesse caso em específico da jornalista e na maioria dos outros poderiam sim ter evitado. O Estado falhou em proteger a vítima, mesmo com múltiplos alertas de que ele era perigoso. Eu concluo que precisamos punir os agressores  antes que mais mulheres morram".